O pecado da certeza

A certeza é um dos maiores inimigos do investidor.

Recentemente vi o filme Conclave, que está disponível na Amazon Prime. Ele mostra a estória, baseada em como é feita de verdade, a escolha do novo Papa. No filme, os cardeais católicos se enclausuram para o processo de seleção e acontecem reviravoltas com os principais envolvidos. Para “abrir os trabalhos”, o decano Cardeal Lawrence que lidera o conclave faz um discurso. Ele pede para que os cardeais votem em um Papa que possui dúvidas, que peca, que pede perdão. Que seja vigilante quanto ao pecado da certeza. Ele prega que a certeza é a maior inimiga da tolerância, a maior inimiga da unidade.

Se eu puder te contar mais uma, nas Histórias de Herótodo, ele conta sobre Creso, rei da Lídia. Em um ato de sabedoria, ele enviou mensageiros para todos os oráculos que haviam espalhados pelas terras conhecidas para testar sua eficácia. Fez uma simples pergunta: “O que estou fazendo nesse exato momento?”. A coordenação de horários e de dias de viagem foi feita, de acordo com Heródoto, para que os mensageiros chegassem ao mesmo tempo, enquanto o rei estivesse fazendo algo específico. O único oráculo que acertou o que Creso estava fazendo foi o de Delfos. Quando recebeu a informação do mensageiro, Creso passou a ter certeza que o oráculo de Delfos estaria correto. A próxima pergunta que Creso enviou para o oráculo foi “Eu devo atacar a Pérsia?”. O oráculo respondeu – cripticamente – que “Se o rei Creso atacar a Pérsia, um grande império cairá.” Satisfeito com essa resposta, Creso atacou a Pérsia com a certeza que o grande império da Persa cairia. E o oráculo estava certo. O seu império, o grande império da Lídia, caiu.

A certeza faz com que aceitemos uma tese como verdade absoluta. A certeza vira uma nova realidade. E é muito difícil perceber a diferença entre uma realidade que existe, e uma realidade que é fruto da certeza sem embasamento no mundo real.

Essa certeza nos leva a erros de julgamento e de interpretação de fatos, já que precisamos distorcê-los para caber dentro da visão mundo formada pela certeza.

Pense em todas as pessoas que mesmo vendo a realidade dos fatos, escolhem, por causa de sua certeza, ignorá-los ou ainda pior, interpretá-los de forma a fortalecer sua certeza mesmo quando a contradizem.

Como consultor de investimentos, procuro adotar um visão extremamente cética e cínica do mundo. Isso não significa que “não acredito em nada”.

Procuro não acreditar nas coisas. Procuro. Quando possuo alto grau de confiança em algo, é porque esse algo já passou por diversos testes de stress, ao longo de muito tempo, e assim independe da minha crença.

Vou dar dois exemplos.

O Banco do Brasil foi criado em 1808. Até o momento, vem enfrentando diversas crises de crédito, crises de confiança, casos de corrupção, desvios, euforias, depressõs econômicas… e o banco segue. O tempo passa, o tempo voa, e a poupança Bamerindus faliu. O Banco Garantia, com seus gênios e feras nenéms quase quebrou. O Banco Brasil segue. Já o Nubank, não sei. Dizem que é sucesso. Eu digo que não passou por muitas crises ainda. Eu não preciso acreditar no Banco do Brasil. Mas eu precisaria acreditar no Nubank.

Shakespeare é um bom autor. Unânime. Todos gostam. Menos eu. Eu não vejo tanta profundidade quanto outras pessoas veem, porém, e esse é um grande porém, é uma questão de gosto. Ele é bom. Talvez o maior de todos os dramaturgos que já existiram na raça humana. E obviamente já li e já assisti a diversas de suas peças. Repetidas vezes. Mas nunca me impressionam. Porém, eu adoro o filme Os Incríveis. Para mim é muito mais profundo do que o que está na superfície e essa é uma característica recorrente do escritor, Brad Bird. Eu sei que o filme ainda precisa de tempo para mostrar se é bom de verdade. Se sobrevive ao tempo. Mas, esse é o meu gosto. Certeza e gosto são diferentes.

Infelizmente eu não tenho um “Guia para não cair nas armadilhas psicológicas” ou “Os 7 hábitos das pessoas céticas”. Mesmo porque não é fácil. Nem “gostoso”.

Esse relatório é curto e direto ao ponto. É um chamamento para que você reveja suas certezas. Você não precisa ser tão cético quanto eu. Mas você pode coletar o que para você é positivo e deixar o negativo de lado. O positivo é estar com a sua consciência mais alinhada com a realidade. Com a verdade. O que é realidade e o que é uma certeza que você adquiriu como viés ou como uma percepção má interpretada do mundo?

Para os investidores, quando existem claros indicadores da qualidade de um ativo, e quando estamos torcendo para que algo aconteça?

Toda semana receba o Relatório RP com táticas para você aplicar na sua viagem rumo à independência financeira.

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